Desvalorização do real em face do dólar possibilita revisão do contrato?

A desvalorização da moeda nacional em face do dólar, quando surpreende o tomador de um empréstimo, sempre foi concebida no meio jurídico para possibilitar a revisão de um contrato. 

Todavia, o Superior Tribunal de Justiça proferiu uma decisão contrária à esse entendimento. No caso julgado, entendeu o tribunal que tratando-se de relação contratual paritária – a qual não seria regida pelas normas consumeristas –, a maxidesvalorização do real em face do dólar americano ocorrida a partir de janeiro de 1999 não autorizaria a aplicação da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, com intuito de promover a revisão de cláusula de indexação ao dólar americano. 

O julgado dotou a tese de que na relação contratual, a regra é a observância do princípio pacta sunt servanda, segundo o qual o contrato faz lei entre as partes e, por conseguinte, impõe ao Estado o dever de não intervir nas relações privadas. Ademais, o princípio da autonomia da vontade conferiria aos contratantes ampla liberdade para estipular o que lhes convenha, desde que preservada a moral, a ordem pública e os bons costumes, valores que não podem ser derrogados pelas partes. 

Desse modo, a intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, exigiria a demonstração de mudanças supervenientes das circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) e de evento imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva), que comprometam o valor da prestação, demandando tutela jurisdicional específica, tendo em vista, em especial, o disposto nos arts. 317, 478 e 479 do CC. 

Nesse passo, para o tribunal, constituiria pressuposto da aplicação das referidas teorias, a teor dos arts. 317 e 478 do CC, como se poderia extrair de suas próprias denominações, a existência de um fato imprevisível em contrato de execução diferida, que imponha consequências indesejáveis e onerosas para um dos contratantes. 

Porém, os contratos de financiamento são relações de consumo, inclusive com entendimento firmado perante o STF, e nestas relações, basta que a onerosidade seja excessiva, sem necessidade de se demonstrar os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis. Demais disso, a desvalorização da moeda sempre foi um acontecimento extraordinário que justificou a revisão dos contratos de financiamento.